Carla Marques - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carla Marques
Carla Marques
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Doutorada em Língua Portuguesa (com uma dissertação na área do  estudo do texto argumentativo oral); investigadora do CELGA-ILTEC (grupo de trabalho "Discurso Académico e Práticas Discursivas"); autora de manuais escolares e de gramáticas escolares; formadora de professores; professora do ensino básico e secundário. Consultora permanente do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacada para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Um simples roupão de banho pode ser considerado uma indumentária?

Resposta:

Em determinados contextos, um roupão de banho pode, com efeito, ser considerado indumentária.

A palavra indumentária pode ter várias aceções. No caso em apreço, o uso pode ativar sentidos como «conjunto de roupas usadas por uma pessoa». Também pode ser associada a um evento específico, com o valor de «tipo de roupa usada num determinado evento, contexto».

Assim, poderemos afirmar algo como:

(1) «A indumentária da festa foi o roupão e o fato de banho.»

(2) «Em casa, a indumentária preferida do João é o roupão.»

Disponha sempre!

Pergunta:

Gostaria que me esclarecessem quanto ao valor aspetual configurado no seguinte enunciado:

«O João começou a fazer os trabalhos de casa depois do almoço.»

A minha dúvida prende-se com o valor aspetual presente no complexo verbal «começou a fazer».

Por um lado, parece poder ser imperfetivo; mas a utilização do pretérito perfeito deixa-me a pensar se deverá ser considerado perfetivo.

Obrigado.

Resposta:

O valor aspetual presente na frase em apreço é o imperfetivo.

Um dos elementos distintivos entre os valores perfetivo e imperfetivo está relacionada com a forma como estes perspetivam a situação. Assim, o valor perfetivo apresenta a situação como estando completa, descrevendo-a na sua totalidade. Já o valor imperfetivo apresenta a situação como incompleta, perspetivando-a sem olhar ao todo e, normalmente, numa das suas fases: início, decurso ou fim.

Assim, na frase apresentado pelo consulente, constatamos que o complexo verbal «começou a fazer os trabalhos» veicula uma visão da situação no seu início, não existindo informação sobre um estado de completude. Deste modo, estamos perante a configuração do aspeto imperfetivo.

Disponha sempre!

«Quem com porcos anda, farelo come»
Significado do provérbio

No desafio semana, a professora Carla Marques explora a significação do provérbio ««Quem com porcos anda, farelo come» (apontamento divulgado no programa Páginas de Português, na Antena 2, de 01/06/2025) .

Pergunta:

Gostaria de saber se a palavra "contactante" existe na língua portuguesa.

Encontrei no site da Priberam, mas não existe em mais nenhum...

Obrigado.

Resposta:

O adjetivo contactante é uma palavra bem formada e já tem, com efeito, verbete no Dicionário Priberam.

Contactante significa «que ou quem faz contacto» e forma-se a partir da junção do sufixo -nte à base verbal contacta-, tal como acontece com outras formas adjetivas que indicam o agente de uma determinada ação: visitante ou amante, por exemplo. 

Este termo entrou já há mais tempo na variedade do português do Brasil, como atesta a sua presença em diversos dicionários brasileiros. No entanto, é possível também assinalar a sua presença em usos de português europeu, embora estes pareçam menos frequentes.

Eis alguns registos, identificados no Corpus do Português, de Mark Davies:

(1) «[...] disse à agência Lusa que "o alerta foi dado via 112 e que o contactante informou que, [...]» (RTP)

(2) «[...] um telefone atende o contactante com base num rígido e singelo algoritmo [...]» (Diário de Notícias)

Pergunta:

Tenho uma pergunta sobre a preposição usada com o substantivo viagem. Estou a aprender português e, com muita frequência, tenho dúvidas nesse aspeto (na utilização de preposições depois de substantivos).

Encontrei algumas páginas aqui, no Ciberdúvidas, sobre a regência do verbo viajar. Pelo que entendi, devemos usar sempre a preposição para depois deste verbo (não importa se a estadia é de longa ou de curta duração). Mas qual é a situação com o substantivo viagem? Devo dizer «Pretendo fazer uma viagem à Alemanha em agosto», ou «Pretendo fazer uma viagem para a Alemanha em agosto»?

Agradeço antecipadamente a vossa ajuda!

Resposta:

Há várias possibilidades de uso de preposição com o nome viagem.

Recordemos, antes de mais, que, para além da preposição para, o verbo viajar pode construir-se também com as preposições combinadas «de…para»:

(1) «Ele viajou de Lisboa para Madrid.»

Também se pode usar com a preposição por:

(2) «Ele viajou por locais exóticos.»

Com o nome viagem, é possível também usar diversas preposições, como a combinação «de…a»:

(3) «A viagem de Lisboa a Madrid foi calma.»

ou a combinação «de…para»:

(4) «A viagem de Lisboa para Madrid foi calma.»

Viagem pode ser usado apenas com a preposição a (5), apenas com a preposição para (6), apenas com a preposições por (7) ou até com a locução adverbial «através de» (8):

(5) «O livro fala da viagem à lua.» (à = contratação da preposição a com o artigo definido a)

(6) «A ação decorre numa viagem para o Algarve.»

(7) «Fez uma viagem por Lisboa.»

(8) «Era uma perigosa viagem através da savana.»

Disponha sempre!